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23 de fevereiro de 2022Impacto do vírus no cérebro determinou o aumento da prevalência dos transtornos mentais, o que tornou quase que obrigatório às empresas cuidar da saúde mental de seus colaboradores
Após a crise pandêmica, o assunto saúde mental tornou-se fundamental. As pessoas sentiram um impacto muito grande decorrente de toda a transformação que a covid-19 causou em suas vidas. De uma hora para outra, elas perderam a liberdade de ir e vir.
Os impactos foram muito significativos, não apenas em termos sanitários. A pandemia influenciou no senso de segurança das pessoas, tornando difícil projetar o futuro. “Muitas também tiveram de lidar com o desafio do home office, precisando equilibrar as demandas da vida doméstica e familiar com as do trabalho, transformando suas vidas”, explica Ana Carolina Peuker, diretora de Mercado e Expansão da Associação Brasileira de Qualidade de Vida (ABQV).
Além disso, muitos perderam familiares e entes queridos, o que gerou uma carga emocional bastante expressiva. Segundo especialistas, o próprio impacto do vírus no cérebro também determinou o aumento da prevalência dos transtornos mentais. Algumas pessoas tiveram quadros classificados como “covid longa”, que gerou problemas neuropsicológicos, com prejuízos de memória e atenção.
Outro fato que determinou o aumento dos transtornos mentais foi a descontinuidade dos tratamentos. Muitos daqueles que já sofriam de algum transtorno mental tiveram de interromper seus tratamentos durante o período de confinamento. “Tudo isso fez com que emergisse o que os pesquisadores têm chamado de quarta onda da crise pandêmica, para a qual não há vacina, que é a onda de adoecimento mental, decorrente de todo esse impacto da crise sanitária”, destaca Ana Carolina.
Com relação ao trabalho, a adaptação muito rápida pela qual as pessoas tiveram de passar no ambiente não foi simples. “Aquelas que já vinham demonstrando alguns sinais referentes ao enfretamento de questões emocionais apresentaram sintomas mais rapidamente. Outras, conforme o tempo foi passando, deram sinais de esgotamento mental por conta do uso da tela, do nível de atenção redobrado e por ter a atenção disputada dentro do ambiente familiar”, ressalta FaÌtima Macedo, membro do Conselho Deliberativo da ABQV.
Conforme foram crescendo os índices de contaminação e mortes, cresceram também a ansiedade, a depressão e outros sintomas de estresse. Isso obrigou muitas empresas a tomarem uma ação efetiva para cuidar da saúde mental de suas equipes. “As empresas precisam oferecer instrumentos e ferramentas para que as pessoas deem conta emocionalmente de lidar com tudo que está acontecendo. Isso já era uma necessidade, que acabou sendo ampliada devido à pandemia, tornando quase obrigatório às organizações cuidar da saúde mental no ambiente de trabalho”, comenta Fátima.
Desafios
Mesmo com o novo olhar das empresas para a saúde mental no trabalho, os desafios mais sensíveis de mantêm. Na opinião de Fátima, resolvendo essas questões, diversas outras por si só acabarão sendo solucionadas.
Em 2014, a Agência Europeia de Saúde e Segurança publicou o Guia Temático de Riscos Psicossociais do Trabalho, com riscos e efeitos na saúde, além de prevenção. Segundo o documento, os riscos psicossociais e o estresse ocupacional apresentam os maiores desafios em matéria de segurança e saúde no trabalho, pois têm um impacto significativo na saúde mental do trabalhador e na organização como um todo.
Sendo assim, é fundamental ampliar a temática dentro da empresa. “As companhias acabam tendo uma postura mais reducionista, muitas vezes colocando o foco apenas no trabalhador e na doença. Mas é preciso olhar também para dentro da própria organização, para os fatores de riscos psicossociais e, em especial, para as questões organizacionais, que podem contribuir para o adoecimento mental do trabalhador”, explica Fátima.
O primeiro passo é identificar quais são esses estressores ou os fatores de risco, mapear, mensurar, avaliar o seu impacto e o quanto eles são contributivos para o adoecimento no ambiente de trabalho, sem procurar culpados.
Outra questão que tem sido muito discutida é a sobrecarga de trabalho, que tem levado muitas pessoas ao esgotamento. Mais uma vez, a empresa deve entender o que está por trás disso. Dimensionamento errado de equipe, falta de treinamento e retrabalho são exemplos de situações que mais contribuem para o problema.
“Por meio do levantamento dos estressores, é possível partir para planos de ação. Muitas empresas acham que esse processo é complexo, que será muito trabalhoso e que pode ser caro, mas não é, e se torna cada vez mais necessário no caminho para ambientes de trabalho mais saudáveis”, salienta Fátima.
Importante ressaltar que não adianta ficar cobrando o trabalhador e dar ferramentas para que ele cuide melhor da sua saúde mental, pois não bastam ações apenas individualizadas, como psicoterapia, meditação e psicoeducação. É preciso levar informação, senão, corre-se o risco de continuar colocando em cima do trabalhador a responsabilidade tanto pelo seu adoecimento quanto pela sua melhora. Portanto, dentro do ambiente de trabalho é necessário promover ações e oferecer ferramentas que corrijam questões organizacionais e transformem esse ambiente de trabalho.
Outro desafio, que é uma grande oportunidade no momento atual, na opinião de Fátima, é realizar a verdadeira promoção da saúde mental: diferenciar o que é saúde mental, quais são os fatores de proteção à saúde do trabalhador e o que é possível oferecer dentro desse contexto para ajudá-lo a fortalecer a sua saúde mental.
“Muitas ações dentro de empresas apenas ‘enxugam gelo’, porque elas trabalham muito mais para diminuir a prevalência do adoecimento mental em vez de cuidar da incidência. É preciso fortalecer o trabalhador nas suas competências, habilidades e características, para que ele lide melhor com algumas questões. É olhar mais para as causas e menos para a doença”, encerra Fátima.