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A pandemia do novo coronavírus chegou desestabilizando mercados, indústrias, empresas e desafiando modelos de gestão, afetando direta e indiretamente bilhões de pessoas por todo o mundo. Esse contexto tem tornado ainda mais evidente a expressão “mundo VUCA”.
Pensando em como criar condições de adaptação a esse contexto cada vez mais caótico que o exército americano cunhou a expressão em inglês chamada VUCA. A expressão busca sintetizar a ideia de que vivemos em um mundo volátil (volatility), incerto (uncertainty), complexo (complexity) e ambíguo (ambiguity), sendo necessário, por portanto, um novo tipo de organização para que possamos encontrar ferramentas e métodos necessários para enfrentar um ambiente extremamente desafiador.
“Saúde, qualidade de vida e bem-estar hoje preocupam países, instituições e empresas. Com os avanços da tecnologia, as pessoas estão vivendo mais, têm a possibilidade de diagnósticos mais precisos, melhores tratamentos, mais acesso a orientações de como se vive melhor. Mas, por outro lado, vemos o cuidado mais fragmentado, o aumento da ansiedade, da depressão e dos danos causados pelo excesso de informação. Ou seja, tecnologias mudam e trazem mudanças inclusive na forma em que cuidamos da saúde”, afirmou o conhecido médico, executivo, estudioso em saúde e conselheiro da Inlags Academy – organização voltada para a educação em saúde, com o propósito de oferecer educação inclusiva e equitativa de qualidade, Paulo Marco Senra Souza, em sua conferência intitulada “Inovação em saúde e bem-estar num mundo VUCA”, realizada no primeiro dia do 19º Congresso Brasileiro de Qualidade de Vida (CBVQ), promovido de 17 a 20 de maio, pela Associação Brasileira de Qualidade de Vida (ABQV), em formatado totalmente digital.
Apesar de originalmente ser utilizada para explicar contextos de guerra, no mundo dos negócios a expressão VUCA é expandida para o ambiente empresarial, traduzindo as mesmas percepções para o universo corporativo. Ressaltando, assim, os desafios que as empresas vão ter de enfrentar para se manter competitivas e inovadoras.
“As pessoas, em nível individual e coletivo, também são afetadas diretamente por esse momento de transformações intensas e absolutamente disruptivas. Isso se traduz em desafios pessoais enormes, justamente pela quebra de padrões até pouco tempo tidos como corretos e seguros. Essa incerteza pode trazer um ambiente de aflição em que as pessoas ficam à mercê das suas expectativas”, alertou Souza.
Diante de tantos obstáculos, desafios e dúvidas, as empresas devem pensar em como gerenciar pessoas para que se possa canalizar ações e esforços individuais em torno de um objetivo coletivo. A necessidade passa a ser por empatia multifuncional, resiliência evolutiva e recapacitação.
“Portanto, mais do que nunca é preciso seguir investindo em ações de treinamento, que possam preparar as pessoas para lidar com os desafios do mundo VUCA, buscando olhares diversos para encontrar respostas inovadoras para problemas complexos”, esclareceu Souza.
Ele lembrou que a ciência e a tecnologia são os fatores-chaves para explicar a redução da mortalidade por várias doenças, como as infecciosas, e o consequente aumento da longevidade dos seres humanos.
No entanto, viver mais tem trazido outros problemas, como condições de saúde crônicas e mais complexas. Na medida em que a população envelhece e a demanda por melhores condições de vida continua a aumentar, os custos com a saúde crescem substancialmente.
Souza explicou que em vários países, inclusive no Brasil, a questão que mais preocupa em relação ao tema são os custos dos sistemas de saúde. A desigualdade do acesso aos serviços de saúde e o cuidado com os idosos vêm em seguida.
“O custo em saúde é muito alto e a tecnologia é um dos fatores responsáveis por esse cenário e temos de enfrentar essa nova realidade: como garantir mais saúde com menos medicina e hospitais, menor tempo de internação, menos reinternação, cirurgias, idas aos centros médicos, de diagnósticos e de terapias? A resposta é fruto da nova era que estamos vivendo”, comentou Souza.
Mudanças sociais
Inovação não diz respeito apenas a novas tecnologias, mas também às mudanças da sociedade em geral. O especialista em Saúde Coletiva salientou que vivemos num mundo que demanda mais agilidade e precisão, que se beneficia da grande quantidade de dados disponíveis, com uma capacidade inédita de tratamento e processamento, transformando-os em informações úteis para o tomador de decisão.
E os impactos na área de healthcare já começaram e é preciso ficar de olho no que está por vir. Como o fato de cada vez mais as pessoas desejarem ter autonomia sobre a própria saúde. A partir desse desejo, foram criadas diferentes soluções, como aplicativos e dispositivos relacionados à saúde.
“As tecnologias da informação representam uma alternativa promissora para a redução dos custos, para a ampliação do acesso e para a melhoria dos serviços de saúde. O uso de aplicativos de celulares e aparelhos para monitorar condições crônicas de saúde, como diabetes, e alertar os pacientes da necessidade de providências antes que a situação se torne emergencial são alguns dos exemplos mais simples de como essas tecnologias podem ser impactantes”, explicou o médico.
Muito mais promissoras, contudo, são as tecnologias que podem ser desenvolvidas a partir da enorme e crescente disponibilidade de informações sobre doenças e pacientes. Muitos dos gastos com saúde são ineficientes, derivados da escassez de informação e da repetição de exames desnecessários. O acesso e o compartilhamento dos registros médicos têm um enorme potencial de reduzir esses custos.
Souza ainda destacou que o uso de dados e de informações em saúde, em um prazo mais longo, para fins de pesquisas podem revolucionar a compreensão sobre as doenças e a forma como se diagnostica uma série de patologias e enfermidades.
“A medicina de precisão, personalizada para cada paciente em função de seu perfil genético, estilo de vida e indicadores de saúde, é outro ramo de avanço tecnológico que é possibilitado pela enorme disponibilidade de dados sobre pacientes e doenças. Todas essas rotas tecnológicas são disruptivas e encerram um potencial enorme de redução de custos e de aumento da eficiência na atenção à saúde, algo que é de interesse de toda a sociedade”, ressaltou o especialista.
Os potenciais e as promessas dessas novas tecnologias são gigantescos e podem ser extremamente benéficos para toda a sociedade. Dado isso, como estimular o surgimento e acelerar a difusão dessas inovações?
O primeiro grande desafio é justamente o regulatório. Como tornar as agências reguladoras ágeis e eficientes para fazer frente ao progresso acelerado das novas tecnologias é uma dificuldade no mundo todo.
Um obstáculo adicional, especialmente no caso dos países em desenvolvimento, é a infraestrutura de assistência à saúde e o financiamento para os serviços públicos. O Sistema Único de Saúde (SUS), por exemplo, passa por essa dificuldade e a incorporação de novas tecnologias geraria a redução de muitos custos. Porém, isso esbarra em coisas simples, como a disponibilidade de infraestrutura básica na ponta: computadores, sistemas e acesso à banda larga.
“Todos esses são aspectos críticos em que a atuação ágil e eficiente dos governos pode significar a diferença entre ser ou não um player relevante nessa área, e entre colher ou não os benefícios das novas tecnologias”, pontuou Souza.
Transformação digital
A transformação digital é um processo que já tinha sido iniciado, mas foi acelerado pela pandemia. No entanto, é preciso ter alguns cuidados para conseguir transformar sem comprometer o resultado. Um desses pontos que devem ser amplamente utilizado é o desenvolvimento das habilidades e competências de liderança nas organizações.
“Uma liderança que consegue promover um ambiente de trabalho colaborativo e de integração é outro jeito de se preparar para o mundo VUCA. Um líder que motiva a equipe e confere a autonomia necessária aos seus colaboradores, implementa programas de promoção à saúde e qualidade vida, permite que as decisões sejam tomadas com mais agilidade. Nesse sentido, também é interessante incentivar a valorização dos profissionais”, explicou Paulo Souza.
Outro ponto salientado pelo médico é que empresas acabam por verificar que os resultados são complexos e difíceis de alcançar porque a tecnologia é um viabilizador, um acelerador da transformação digital, mas é um meio e não um fim.
“A transformação digital passa por colocar o ser humano no centro das atenções. Isso significa que a experiência do indivíduo passa a ser o carro-chefe do desenvolvimento de qualquer produto ou serviço. Por isso, a necessidade de fomentar uma nova cultura e tornar a organização mais flexível para responder às necessidades. E isso se aplica também internamente onde as organizações precisam priorizar e engajar os seus colaboradores para que o resultado e o crescimento sejam mais sustentáveis”, ressaltou Souza.
Ele comentou que a experiência descrita no livro de Shardan Nandram “Inovação Organizacional pela Simplificação Integrada”, que relata a experiência bem-sucedida em atenção primária de Buurtzorg – uma organização de saúde exemplar, da Holanda –, com foco no cliente e cuidado genuíno no “modelo cebola” (camadas de cuidado que presam pela independência com base em valores humanos universais), seria interessante para o Brasil.
“Um novo modelo de gestão, com foco na atenção primária e auto-organização traz confiança, autonomia, redução da complexidade, ações que impactam positivamente à assistência à saúde. Mas, parafraseando Adib Jatene: ‘Nada começa pronto e estamos construindo um futuro’”, finalizou Souza.